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Sistema Urinário

   Nesta seção abordaremos a histologia dos componentes do sistema urinário, são eles: rins, ureteres, bexiga e uretra.

RINS

   Os rins são responsáveis por reter materiais essenciais, como a água, eletrólitos essenciais e metabólitos; e remover dejetos do metabolismo do corpo. Por meio disso o órgão desempenha seu papel fundamental na regulação e manutenção da composição e do volume de líquido extracelular e manutenção do equilíbrio acidobásico. Para tal os rins são altamente vascularizados e recebem cerca de 25% do débito cardíaco, que é submetido a um processo refinado de filtração e reabsorção, originando a urina que, em condições fisiológicas, contém água, eletrólitos, ureia, ácido úrico e creatinina e as escórias de várias substâncias.

   Porém, o rins também funcionam como órgãos endócrinos, o que se justifica por: (a) síntese e secreção do hormônio glicoproteico eritropoetina (EPO), que atua na medula óssea induzindo a formação de hemácias em resposta à concentração diminuída de oxigênio no sangue; (b) síntese e secreção de renina, que desempenha papel importante no controle da pressão arterial e no volume sanguíneo; (c) hidroxilação da 25-OH vitamina D3, precursora dos esteroides e produzida no fígado, em 1,25-(OH)2 vitamina D3 hormonalmente ativa.

   A superfície renal é revestida por uma cápsula, um revestimento de tecido conjuntivo da superfície renal. Consiste em duas camadas: a externa composta por fibroblastos e fibras de colágeno e a interna de tecido celular contendo miofibroblastos, que apresentam atividade contrátil importante nas variações de volume e de pressão que podem acompanhar as variações da função renal. Já o parênquima renal pode ser dividido em duas regiões: o cortéx e a medula.

   O cortéx é uma região mais externa, de cor marrom-avermelhada devido ao rico suprimento sanguíneo da ordem de 90% a 95% de todo o sangue que circula nos rins. Nele encontramos alguns segmentos do néfrons, as unidades funcionais dos rins, como os corpúsculos renais, túbulos contorcidos, túbulos retos, túbulos coletores e ductos coletores.

   A medula está presente mais profundamente, organiza-se em um arranjo de várias porções de formato piramidal. A coloração é bem mais clara em virtude do volume de sangue reduzido. É constituída pela continuação dos túbulos retos do néfrons e ductos coletores que culminam no ápice das pirâmides, formando a chamada área cribriforme.

O NÉFRON

   Tendo em vista a formação do parênquima renal por essas duas porções podemos agora compreender a organização e composição das unidades funcionais dos rins, os néfrons. Neles é que ocorre a filtração do sangue e em seguida reabsorção do filtrado, restando ao final apenas a urina.

   A porção incial de um néfron é o corpúsculo renal, que é formado pela cápsula de Bowman e o glomérulo envolto por ela. A cápsula de Bowman é constituída por uma camada interna, ou visceral, e outra externa, ou parietal, que são separadas pelo espaço capsular que recebe o ultrafiltrado glomerular. O glomérulo é um conjunto de cerca de 10 a 20 alças que são supridas pelo sangue oriundo de uma arteríola aferente enquanto no lado oposto esse sangue flui através da arteríola eferente. Essa organização permite que por meio da contração endotelial de uma arteríola ou outra adequações do volume e velocidade de filtração sejam realizadas.

   O sangue que chega ao glomérulo é filtrado através da barreira de filtração glomerular que é formada por três camadas:

  1. Endotélio dos capilares glomerulares – ele possui mais fenestrações e elas são mais irregulares do que o que se observa em outros capilares do corpo. Além disso, verfica-se ausência de diafragma recobrindo as fenestrações dos capilares. Nas células endoteliais dos capilares o número de canais de aquaporina-1 (AQP-1) é elevado, permitindo o movimento rápido de água através do epitélio.

  2. Membrana basal glomerular (MBG) – é uma lâmina basal espessa constituída pela união do endotélio e dos podócitos, as células da camada visceral da cápsula de Bowman. A MBG é constituída por uma rede de colágeno do tipo IV, laminina, nidogênio, entactina, proteoglicanas e glicoproteínas multiadesivas.

  3. Camada visceral da cápsula de Bowman – é formada pelos podócitos ou células epiteliais viscerais, que estendem prolongamentos ao redor dos capilares glomerulares. Entre os prolongamentos podálicos interdigitantes restam espaços, as fendas de filtração com cerca de 40 nm de largura, que são recobertas pelo ultrafino diafragma da fenda de filtração. Estudos recentes mostram que esse diafragma é formado por uma complexa estrutura proteica, na qual a proteína transmebrana nefrina tem papel estrutural e funcional essencial.

   Portanto, após passar por essas camadas o filtrado alcança o espaço capsular.

  Porém, ainda no corpúsculo renal, um outro grupo de células têm importante papel. Localizadas entre as células endoteliais dos capilares glomerulares, as células mesangiais juntamente com a matriz extracelular ao seu redor formam o mesângio, que realiza:

  • Fagocitose e endocitose, que permite a remoção de resíduos aprisionados e proteínas agregadas da MBG e do diafragma de filtração. Além da endocitose de uma variedade de proteínas plasmáticas, incluindo os complexos imunes.

  • Suporte estrutural, pois as células mesangiais produzem componentes da matriz para suporte dos podócitos em áreas onde a membrana basal epitelial é ausente ou incompleta.

  • Secreção, que se resume na produção de moléculas como interleucina-1, PGE2 e fator de crescimento derivado de plaquetas (PDGF) pelas céulas mesangiais, principalmente quando ocorre lesão glomerular.

  • Modulação da distensão glomerular, devido as propriedades contrateis da células mesangiais.

 

   O polo por onde passam as arteríolas ligadas a um glomérulo é chamado de polo vascular. O polo oposto é chamado polo urinário, nele o túbulo contorcido proximal se conecta ao corpúsculo renal, e o filtrado flui nessa direção por um sistema de túbulos responsáveis por reabsorver frações do fluido que são necessárias a homeostasia.

ORGANIZAÇÃO ESTRUTURAL DO SISTEMA DE TÚBULOS RENAIS

   Esse sistema de túbulos que compõe o néfron pode ser dividido em três segmentos compostos por túbulos que possuem características específicas, conforme veremos a seguir.

   O segmento espesso proximal consiste em: túbulo contorcido proximal, que segue um curso tortuoso a partir do corpúsculo renal até o raio medular; e o túbulo reto proximal ou ramo descendente espesso da alça de Henle, que desce até a medula. Em continuação inicia o segmento delgado que é formado pela parte delgada da alça de Henle, a qual se divide em ramo descendente e ramo ascendente, que penetra na medula e em seguida retorna em direção ao córtex. Conectado ao seguimento anterior temos o seguimento espesso distal que inicia com o túbulo reto distal, também conhecido como ramo ascendente espesso da alça de Henle, que mantem-se em sentido ascendente em direção ao córtex até que passa justaposto ao córpúsculo renal. Nesse ponto específico as células epiteliais do túbulo adjacente à arteríola são modificadas para compor a mácula densa, discutida adiante. Por fim o seguimento espesso distal é também formado pelo túbulo contorcido distal, que segue um trajeto tortuoso até o raio medular onde culmina no ducto coletor por meio do túbulo coletor arqueado.

   Diversos túbulos coletores arqueados prosseguem no raio medular conectando-se a um ducto coletor cortical ou medular, que segue em direção ao ápice da pirâmide até que funde-se a ductos maiores, os ductos papilares que culminam na área cribriforme. Neste ponto o filtrado que se tornou urina ao longo do sistema de túbulos desemboca nos cálices menores passando em seguida para os maiores e para a pelve renal que se conecta ao ureter. 

FUNÇÃO DOS SEGMENTOS DO SISTEMA DE TÚBULOS RENAIS

   

   Embora a simples condução seja uma função importante dos túbulos renais, eles desempenham ainda outras funções que abordamos a seguir.

O túbulo contorcido proximal é formado por células cúbicas que exibem especializações comuns às células que realizam absorção, como: borda em escova, composta de microvilosidades retas e relativamente longas; complexo juncional, formado por uma zônula de oclusão estreita que veda o espaço intercelular da luz do túbulo e uma zônula de adesão que mantém a união entre as células vizinhas; pregas ou dobras nas superfícies laterais das células; e interdigitação dos prolongamentos basais das células adjacentes. Essas especializações contribuem para o processo de reabsorção de cerca de 65% do ultrafiltrado que ocorre nos túbulos contorcidos proximais. Duas proteínas são responsáveis por esse processo: as bombas de Na+/K+-ATPase, que são responsáveis pela reabsorção de Na+ o qual é seguido pela difusão passiva de Cl- para manter a neutralidade eletroquímica, com isso o acúmulo de NaCl nos espaços intercelulares cria um gradiente osmótico que atrai a água; e a aquaporina-1, uma proteína que funciona como um canal de água na membrana celular dos túbulos contorcidos proximais. Além disso, esses túbulos são revestidos por um glicocálice bem desenvolvido contendo diversas ATPases, peptidases e altas concentrações de dissacaridases que realizam digestão adicional dos aminoácidos antes destes sofrerem endocitose.

   No túbulo reto proximal se encontram células com borda em escova menos desenvolvida e prolongamentos laterais e basolaterais menos complexos e em menor número. Portanto, não são tão eficientes para absorção.

   O segmento delgado da alça de Henle apresenta dois ramos funcionalmente distintos. O ramo ascendente é altamente permeável à água e pouco permeável a solutos, mas a água ainda assim difunde-se para fora nesse trecho graças à hiperosmolaridade do líquido intersticial na medula. O ramo ascendente é altamente permeável ao NaCl que sofre difusão passiva e não transporte ativo nesse trecho, o Cl- difunde-se para dentro do interstício seguindo seu gradiente de concentração através dos canais de condução de Cl- e o Na+ e K+ acompanham passivamente para manter a neutralidade eletroquímica.

   O túbulo reto distal ou ramo ascendente espesso da alça de Henle, assim como o ramo ascendente delgado, transporta íons da luz tubular para o interstício através de canais de Cl- e K+ e bombas de Na+/K+-ATPase. Estas ao transportar íons K+ para a luz tubular tornando a carga desse espaço positiva e com isso impulsiona a reabsorção de íons como o Ca2+ e o Mg2+.

   Outra importante função relacionada ao túbulo reto distal é a do aparelho justaglomerular, que tem como protagonista a mácula densa, um conjunto de células especializadas do túbulo presentes no ponto em ele passa adjacente às arteríolas aferentes e eferentes e ainda à algumas células mesangiais extraglomerulares. As células justaglomerulares, são células musculares lisas especializadas da arteríola aferente que são estimuladas em situações fisiológicas e patológicas, nas quais se verificam redução dos níveis de sódios ou do volume de sangue circulante. Quando estimuladas elas ativam o sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA) que é responsável pela manutenção da homeostase do sódio e da hemodinâmica renal.

   A ativação das células justaglomerulares é mediada pelas células da mácula densa que monitoram a concentração de sódio no líquido tubular. A redução dos níveis de Na+ no túbulo contorcido distal estimula moléculas transportadoras de íons expressas na membrana apical das células da mácula densa, como os contransportadores de Na+/2Cl-/K+, permutadores de Na+/K+ e canais de K+ regulados por pH e pelo cálcio. Com isso vias de transporte da membrana são ativadas e a concentração de íons intracelulares nas células da mácula é modificada induzindo a liberação de mediadores, como o ATP, a adenosina, o óxido nítrico e as prostaglandinas que sinalizam para as células justaglomerulares subjacentes da arteríola aferente estimulando a secreção da renina e para as células musculares lisas vasculares induzindo a vasoconstrição.

   As células justaglomerulares produzem e armazenam grânulos com aspartil protease, a renina, que é liberada na corrente sanguínea, onde irá catalisar a hidrólise do angiotensinogênio que resulta em angiotensina I. Esta é convertida a angiotensina II por ação da enzima conversora de angiotensina (ECA) que é encontrada nas células endoteliais dos capilares pulmonares. A angiotensina II estimula a síntese e secreção de aldosterona na zona glomerular da glândula suprarrenal e também tem ação vasoconstritora, importante no controle da resistência vascular renal e sistêmica. A aldosterona age nos ductos coletores aumentando a reabsorção de sódio e consequemente de água, elevando assim o volume sanguíneo e a pressão arterial.

   No túbulo contorcido distal ocorre: reabsorção de Na+ e secreção de K+ no filtrado, conservando íons Na+; reabsorção de íons de bicarbonato e concomitante secreção de íons H+ que tornam a urina ácida; e secreção da amônia em respostas às necessidades dos rins de excretar ácido e gerar bicarbonato.

   Por fim, os túbulos coletores e ductos coletores são compostos por dois tipos de células. As células claras, mais presentes nos ductos coletores, possuem um único cílio, poucas vilosidades curtas e uma abundância de canais de água, a aquaporina-2, que são regulados pelo hormônio antidiurético (ADH). Já as células escuras ou intercaladas estão presentes em uma quantidade menor e participam da secreção de H+ ou bicarbonato, dependendo das necessidades dos rins.

URETER, BEXIGA E URETRA

 

   Após atravessar as áreas cribriformes nos ápices das pirâmides renais, a urina chega aos cálices menores e daí é conduzida para os maiores e em seguida para a pelve renal que culmina no ureter, que conduz para a bexiga. Todas essas vias excretoras possuem constituição semelhante, isto é: uma mucosa revestida por epitélio de transição, uma muscular e uma adventícia.

   O epitélio de transição da mucosa é estratificado apresentando nos cálices e pelve duas camadas de células, quatro a cinco camadas no ureter e seis ou mais na bexiga. Essas células são extremamente maleáveis permitindo a distensão dessas estruturas para abrigar o volume de urina presente. Além disso, o epitélio é impermeável a sais e a água.

   A muscular é formada por músculo liso que se organiza sob a lâmina própria em uma camada longitudinal e uma camada circular, facilitando assim o peristaltismo que contribui para a condução da urina ao longo das vias excretoras. Deve-se ressaltar que a muscular na bexiga é mais desenvolvida e recebe o nome de músculo detrusor e no ponto que a uretra fixa-se a este órgão as fibras musculares formam um arranjo anular, denominado esfíncter interno da uretra.

   Ainda sobre a bexiga, observamos inervação do sistema nervoso autônomo. As fibras simpáticas formam um plexo na adventícia da parede vesical e inervam os vasos sanguíneos na parede. Já as fibras parassimpáticas são provenientes dos segmentos S2-S4 da medula espinal e seguem seu curso com os nervos esplânicos pélvicos para a bexiga, onde terminam em gânglios terminais nos feixes musculares e na adventícia e são as fibras eferentes do reflexo de micção. As fibras sensoriais da bexiga até a porção sacral da medula espinal são as fibras aferentes do reflexo de micção.

   Por fim a uretra transporta a urina até o exterior, ela consiste num tubo fibromuscular que termina no óstio externo da uretra. Com diferenças entre a forma como se apresenta no homem e na mulher.

   No homem a uretra tem cerca de 20 cm de comprimento e divide-se em trâs segmentos: a uretra prostática é o segmento inicial com 3-4 cm, revestida por epitélio de transição, ela atravessa a próstata onde culminam nela ductos ejaculadores e prostáticos; a uretra membranosa estende-se por cerca de 1 cm do ápice da próstata até o bulbo peniano, passando através do diafragma urogenital que forma ao seu redor o esfíncter externo da uretra; por fim, a uretra peniana ou esponjosa estende-se por cerca de 15 cm através do corpo esponjoso no comprimento do pênis e se abre na superfície do corpo na glande do pênis, é revestida por epitélio pseudoestratificado colunar até a extremidade distal que é revestida por epitélio estratificado pavimentoso, no seu trajeto recebe ductos das glândulas bulbouretrais e da glândulas uretrais secretoras de muco.

   Na mulher, a uretra é mais curta com apenas 3 a 5 cm de comprimento da bexiga até o vestíbulo da vagina, onde termina posterior ao clitóris. Seu revestimento incia como epitélio de transição e a medida que aproxima-se do exterior altera-se para epitélio estratificado pavimentoso. Assim como no homem, numerosas glândulas uretrais abrem-se na luz da uretra já outras parauretrais secretam nos ductos paruretrais comuns.

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